OLHA PARA MIM

Corpo vivo, rosto brilhante, olhos atentos, pés firmes e fortes para pisar com certeza na estrada onde o desconhecido era a meta. Se eu pudesse voltaria para lá e de lá nunca mas sairia. No entanto quando lá estive sempre soube que para cá chegaria.

Que saudade que dá. Que vontade me dá de voltar no tempo. Vontade esta de estar no jardim da inocência, quando ainda era criança correndo eufórica para os braços de meu pai. Como todo bom e eterno aprendiz da vida, não me arrependo de cá estar. Já vi muitas vidas chegarem e muitas outras partirem, já vi sorriso sendo devolvido em lagrimas e amor em dor. Já vi o fedor da traição e a cor do perdão. Já vi o odor da ingratidão e o refletor da gratidão.   

Ontem fui a flor da primavera, a primeira do ontem para construir o “hoje”. O tempo leva-me aos poucos aquilo que ele mesmo me deu. Vão-me as forças, pisadas frágeis, olhos esmorecidos, falar trémulo, mas com um coração forte e seguro do que sente. Hoje meu corpo é revestido pelos frutos de sementes lançadas pelas ruas por onde pisei, alguns bons e outros nem por isso.

Tenho na bagagem lembranças e lições que o mestre da vida me ensinou.

Eu tenho tanto para te contar, como queria que você se digna-se em dar-me um pouco de tempo do teu tempo. Estou aos olhos de quem não me quer ver. Sou a tua imagem refletida no espelho. Sei que quando para lá fitas teu olhar você me enxerga todos os dias, contemplas meu rosto cansado e com o brilho roubado pelo sorriso dos anos. E é apenas isso que vê, cego não consegue ir mais além, não vê que por trás de um olhar maçante tem um coração marcante e rejuvenescido que nem o tempo e nem as mais profundas cicatrizes da vida podem adormece-lo. 
Deixado para atras já não sou de quem a sociedade espera. Hoje sou passado pela rua por ti que quer chegar a velhice, mas por malandrice fechas-te a sua ilusão; que decepção! não quer ser um idoso. Somos o lado frágil da sociedade, vitimas daqueles que por muito fizemos e hoje por hoje já não mais servimos. Para alguns sou uma relíquia, uma biblioteca preciosíssima, estes ainda dispõem um tempo para me ouvirem, aprenderem e surpreenderem como tanto de lembranças que o mestre da vida me ensinou. Outros parecem não ouvir minha voz, nossas vidas parecem caminhar em direções contrárias, e por isso preferem não me verem, ignorarem e viverem no mundo do faz de conta.

Desesperado? Não!

Já trilhei estas calçadas por onde caminhas, as pisadas que trilhas ás percorri vezes sem conta. Alegro-me em ver-te forte, contente, confiante, exuberante, robusto, destemido, bem-sucedido, destilando o fragoso perfume por onde quer que passa. Correndo e aprendendo a viver dias bons e maus, um sonhador imparável  um lutador imbatível.

Contudo o certo é que em tempos presentes ou remotos, modernos ou antigos, um idoso será sempre um idoso. 

Não ignores minha existência é para lá onde caminhas.



(Por Telma De Almeida)


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